Em nome da Miss

Miss Brasil

– A mãe diz que ela que escolheu meu nome. Mas o pai disse que foi ele…

Nove meses passariam depressa e era necessário um nome para a criança, segundo bebê do casal e a primeira menina. A inspiração podia ter vindo de qualquer canto. Uma homenagem à mãe de um dos dois? De alguma bisavó? Opção não faltava.

– Foi por causa de uma revista Cruzeiro, na época. Ela estampou a capa da revista O Cruzeiro – lembrou mesmo não lembrando. Nem poderia, ainda não tinha nascido e nunca chegou a folhear a revista que lhe sugeriu o nome.

A notícia foi dada no sofá da sala, pegou a família inteira de surpresa. “Adalgisa Colombo morreu”. Como assim morreu? Meu pai dizia entre uma gargalhada e outra que ela estava sentada no nosso sofá. Não podia ser verdade. Mas era. Aos 73 anos, Adalgisa Colombo morreu no Rio de Janeiro sem ter a causa mortis divulgada. Era quinta-feira, mas descobrimos que ela havia batido as botas apenas no domingo à noite, na divulgação do Fantástico.

Adalgisa Colombo era carioca e foi eleita Miss Brasil em 1958, representando o Distrito Federal. Ficou em segundo lugar no concurso de Miss Universo no mesmo ano. Antes de representar concursos de beleza, também fez uma ponta de atriz no filme “Água na Boca”, de 1956. Durante a década de 60 foi apresentadora da TV Rio. A Adalgisa aqui de casa não pode ouvir falar de câmera, sempre foge dos cliques e das filmagens. E, bem, ela nasceu em 1961. Nunca participou de concurso de beleza, embora, na nossa humilde opinião, seja a mulher mais bonita de nossas vidas. Não à toa meu pai a escolheu como esposa.

Diz o noticiário que Adalgisa Colombo deixou marido e três filhos. A nossa Adalgisa tem apenas uma filha. Nunca esteve no Distrito Federal. Mas sempre ouvi que a história do nome era por causa da tal da Miss. Tem tanto Michael Jackson da Silva, Elvis Presley Pereira, John Lennon Cardoso que meus avós, independente de quem tenha escolhido o nome, tiveram uma boa sacada.

Ora, “Colombo” não era apenas aquele descobridor das Américas. Era também o sobrenome do meu avô. Alcindo Colombo, que Deus o tenha. Seria uma Adalgisa Colombo autêntica. E assim foi: no dia 27 de outubro de 1961, o nome já estava decidido quando ela veio ao mundo.

– E então eu recebi o nome em homenagem à Miss.

Hoje a Miss não está mais entre nós. Mas a Adalgisa Colombo sempre estará.

Mulheres além do morro

Falcão - Mulheres e o Tráfico

O livro do rapper MV Bill e seu produtor, Celso Athayde, é um verdadeiro tour não somente pelo ambiente da favela – amplamente exposto na televisão como um lugar regado à violência e tráfico de drogas. Mas quem são essas pessoas que conduzem a estrada do tráfico? Há muito que postos de liderança nos morros não são dominados exclusivamente por homens. Muitas mulheres são envolvidas, direta ou indiretamente, nesse universo por vezes ignorado por nós, cidadãos – e principalmente pelo governo, segundo Bill.

É basicamente sobre essas mulheres que o livro “Falcão – Mulheres e o Tráfico” (2007) trata. As páginas nos levam para dentro desse (sub) mundo, nos apresenta a diversos personagens intrigantes e reais – que fizeram parte da pesquisa realizada pelos autores durante oito anos em diversos Estados brasileiros. Mães, esposas, prostitutas, adolescentes, donas da boca e donas do morro, que conquistaram espaço e respeito… Na criminalidade. Eu particularmente gosto bastante do formato de entrevista pingue-pongue, então achei de muito bom grado o livro nos apresentar a essas mulheres de modo que elas próprias nos façam ouvir o que têm a dizer e, de quebra, permitir que possamos ouvir suas vozes.

A cada nova entrevista, um novo timbre soava em minha mente, conduzia os sotaques, as gírias e as próprias vivências relatadas por mulheres de diferentes idades. A obra é uma continuação do livro “Falcão – Meninos do Tráfico” (2006), originado a partir das gravações para o documentário de mesmo nome produzido pela dupla. O conteúdo é rico e mostra a realidade da vida precoce – iniciação cedo na droga, no tráfico e, infelizmente, na morte. Em dado momento do livro, MV Bill nos conta que todos nós estamos envolvidos nesse universo – e eu vejo que ignorar também é uma forma de envolvimento.

Nunca estive em uma favela, soa até hipócrita dizer que eu gostei de ler o livro. Mas acredito que o propósito dos autores era esse mesmo: apresentar ao Brasil um problema crônico presente no próprio País. Outro lado da moeda que não conhecemos. Imaginar por todos os lugares que eles passaram, todas as pessoas que conversaram, conheceram, conviveram – até mesmo as histórias que não entraram no livro – me fascina. E não apenas pela vida que cada um compartilha e pelo puro prazer de ouvir histórias, mas pela mudança que Athayde e Bill acreditam e lutam para que ocorra. Onde o simples fato de compartilhar isso com pessoas que eles nem sabem quem são talvez modifique a realidade de pelo menos uma comunidade.

As 270 páginas conduzem à reflexão e ao entendimento de como funciona uma rotina atrelada ao universo da drogadição e ao tráfico. É compreensível o motivo de tantos jovens abdicarem da própria vida por R$ 200 por semana na venda de entorpecentes? Status, falta de oportunidade, vício, dinheiro? São tantas as justificativas que fica difícil classificar o problema em uma única resposta. Mais revoltante que o próprio universo do tráfico, que ceifa a vida de milhões de pessoas no País, é ver como a ação dos policiais na favela enoja e nos faz desacreditar em resultados. Existe o lado certo quando ambos são corrompidos?

Diagramação
A diagramação é agradável, a fonte com serifa permite linearidade à leitura – a utilizada, salvo engano, foi a Times New Roman. Achei interessante que a cada novo capítulo há uma ilustração feita pelo Núcleo feminino de Grafite da CUFA (Central Única das Favelas) que remete à história que será abordada nas próximas páginas. A capa lembra a do primeiro livro “Falcão – Meninos do Tráfico”, onde um garoto tem o rosto quadriculado e com uma tarja preta sobre os olhos. Em “Falcão – Mulheres e o Tráfico”, há uma mulher negra com o rosto não identificado da mesma forma.

Você pode adquirir o livro aqui ou aqui.
O preço varia de R$ 39,90 a R$ 46,90
Páginas: 270
Ano de lançamento: 2007

*Quando a livraria Espaço Maringá, do shopping Maringá Park, estava concluindo suas atividades, as promoções enchiam os olhos e esvaziavam os bolsos. Uma das minhas tantas aquisições, aproveitando o preço baixo, foi o livro em questão. Não tenho o hábito de escrever sobre obras que li, exercício que faço agora.

“Não adianta nada saber fotografar, chegar na rua e não ter aquela experiência”

Reportagem especial sobre o tráfico de drogas em Maringá

Reportagem especial sobre o tráfico de drogas em Maringá

No último bimestre da faculdade de Jornalismo, cada grupo na sala de aula deveria apresentar uma revista produzida pelos alunos, desde a defesa da logomarca até diagramação das páginas e textos publicados (alô Emerson Andujar! Saudades das tuas aulas, professor!). Foi assim que a Enfoca nasceu, uma revista cujo propósito era abordar os bastidores do jornalismo regional com foco no público-alvo, que seriam os estudantes de comunicação e recém-formados. Dessa forma, entrevistei na ocasião, juntamente com meu colega de grupo Johnny Katayama, o Editor de Fotografia do jornal O Diário, João Paulo Santos. Aproveitando que hoje é o Dia do Fotógrafo, publico aqui o resultado desse bate-papo. 🙂

João Paulo Santos, 32, descobriu-se como fotógrafo durante a graduação, que começou em 2002. Após dois anos cursando Jornalismo no Cesumar (Centro Universitário de Maringá), trocou o curso por Publicidade e Propaganda, o que lhe rendeu experiências adicionais no campo da fotografia de estúdio e de moda. Mas o que o encantou mesmo foi o fotojornalismo, área que trabalha desde 2007. “Meu primeiro filme saiu todo escuro, tremido. Na hora pensei: ‘eu sou melhor que isso’, e passei a fotografar todo o fim de semana”, revela. Declaradamente tímido, Santos preferiu ficar atrás das lentes, transformando os acontecimentos maringaenses em registros, quem sabe, para a eternidade. Hoje o fotojornalista é Editor de Fotografia do jornal O Diário do Norte do Paraná. A conversa era para durar, no máximo, dez minutos. Que se se transfiguraram em uma hora de muitas descobertas, que você, leitor, poderá conferir nos fragmentos da entrevista abaixo.

O início

“Estudei dois anos de Jornalismo em 2002 e acabei entrando na faculdade de Publicidade e Propaganda. Na própria faculdade, quando comecei a fazer publicidade, comecei a trabalhar no estúdio de fotografia porque eu já fazia alguns trabalhos no próprio Cesumar de foto. Foi onde comecei mesmo profissionalmente a atuar direto na área de fotografia.

Durante a faculdade eu aprendi a fotografia, a professora Silvinha me incentivava. Eu comprei minha câmera, uma Nikon FX 501 [analógica], todo final de semana eu pegava ela e saía fotografando. Fotografava flor, mendigos na rua, eventos… O meu primeiro filme que fotografei mesmo foi no Demolicar, no parque de Exposições. Saiu tudo escuro, tremido. Foi aí que surgiu a ideia de ser fotógrafo, aprender as técnicas e comprar uma câmera. Eu falei “eu sou melhor que isso”, e todo fim de semana eu fotografava.

O César, que trabalhava antes do estúdio de fotografia me ensinou muita coisa. Tive aula com o Paulo Boni também. Fotografia eu achava aquela coisa poética, e foi o Boni que me ensinou o caminho do jornalismo.”

O que você aprendeu em publicidade contribuiu em algo na área jornalística?

Publicidade foi um complemento mais na questão de estúdio, fotos de moda, estilo. Passei a trabalhar com moda, e quando estava no estúdio eu também dei aula no [Colégio] Objetivo. Nisso eu ensinava e aprendia ao mesmo tempo, tinha gente que não tinha nem noção do que era pegar em uma câmera fotográfica, e isso me despertou muita coisa. Eu me corrigia, foi uma experiência muito bacana. Logo que estava terminando o curso de publicidade surgiu a oportunidade de entrar no jornal, mas na época eu tirava foto de balada, e às vezes pegava um ou dois acidentes.

Porque você trocou a faculdade de Jornalismo por Publicidade e Propaganda?

Sempre fui muito tímido. A maioria dos fotógrafos não gosta de aparecer. Aquilo foi me impressionando um pouco, porque tinha aula de telejornalismo, radiojornalismo, e sempre gostei dos bastidores. Na Publicidade eu vi que tinha a oportunidade de mostrar o meu trabalho sem aparecer. A Publicidade me trouxe onde estou hoje. Mas quero concluir o curso de Jornalismo, para ter uma bagagem a mais. Na questão da bagagem de fotojornalismo não ia me acrescentar muito.

Em Maringá a gente não vê tantos fotojornalistas formados em Jornalismo. Você acha que essa formação é importante para o exercício da profissão?

Acho importante porque fotografia não é só chegar e clicar. Parte teórica, estética, semiótica. É um complemento. O mais importante é você estar na rua, não adianta nada saber fotografar, chegar na rua e não ter aquela experiência. É igual jogador de futebol que eles falam que está fora de ritmo. Às vezes você não sabe se posicionar direito, acaba atrapalhando um pouco. A questão do diploma eu acho que tem que ter, eu não tenho em Jornalismo mas estou correndo atrás. Hoje você pode ter o MTB, ser credenciado na ANJ e atuar como fotojornalista, mas o diploma é algo a mais que você pode oferecer.

Quando você começou no Dflash, também cumpria esporadicamente algumas pautas de polícia. Você tinha estômago suficiente para as cenas fortes no início?

Na verdade não, desde pequeno nunca gostei de ver acidentes, não gostava nem de ir em velório. Mas com o tempo você vai criando uma espécie de sangue frio. Não que você queira fazer aquilo, mas é algo tão natural na sua profissão que acaba se tornando algo corriqueiro. Hoje chego em um lugar e penso que é o meu trabalho, vejo a cena profissionalmente. Evito bastante a questão de expor a família. Existem mil e uma formas de fazer uma foto que chame a atenção e que não denigra a família ou quem está ali. Pode ser uma foto que muita gente não goste, mas eu sei que meu caminho está certo, e quando a família pegar o jornal vai ter um choque, mas não vai sofrer tanto igual muita gente faz de mostrar a situação. Não é qualquer um que é fotógrafo. Se você souber usar a técnica, seu conhecimento, você faz uma foto que pegue um detalhe sem expor. Isso é possível.

Uma foto que causou bastante discussão foi a fotografia que estampou a capado jornal sobre a morte do [ex-secretário municipal de Fazenda de Maringá, Luiz Antônio] Paolicchi. Qual foi a tua opinião na época?

Eu não era editor na época. Creio que pela pessoa pública que ele era, acredito que aquela foto deveria ter saído, mas não no tamanho e no local onde foi publicada. Era uma foto de [página] interna. Tudo depende da hora, da situação, do que está acontecendo. Mesma coisa uma foto do Saddam Hussein: se não mostrasse, ninguém ia acreditar que era ele. Se a gente mostrasse a foto só do carro dele, ninguém ia acreditar. Maringá é uma cidade conservadora, se fosse uma cidade maior, não haveria problema algum. Mas sabendo que Maringá é uma cidade conservadora, poderia ser revisto onde a foto foi publicada.

Se você chega a um jornal onde a linha editorial permite que tenha essas fotos que chocam o leitor, mas você como profissional da fotografia não concorda, como lidar com esse embate?

Tem de ter a situação, não é qualquer foto você vai expor. A foto do Paolicchi circulou o Brasil inteiro. É chocante? É, mas é uma maneira de você mostrar o jornalismo. Recentemente a foto que ganhou o prêmio Esso da Dilma [Rousseff], muita gente falou que foi uma falta de respeito com a Presidente da República. Eu não vejo isso, em questão de segundos o fotógrafo [Wilton Jr., do Estadão] fez uma fotografia que vai ser eternizada.

O fotógrafo consegue ter essas sacadas originais com a experiência da rua ou acompanhando outros trabalhos e estudando?

Vendo o trabalho sempre ajuda, você cria uma coisa ou outra. Mas na rua você cria algo natural, já prevê a fotografia. O fotógrafo sem rua não é fotógrafo. Não considero fotojornalista quem faz fotos só de evento. Essas fotos chocantes são históricas, vai ficar marcado para o resto da vida.

Você se lembra da sua primeira pauta?

Minha primeira pauta, quando comecei, era a cobertura de jogos de bolão no Olímpico. Mas minha primeira foto importante mesmo, que me marcou, foi justamente um assassinato. A pessoa tinha acabado de sair da penitenciária, estava tomando uma cerveja e foi assassinada a sangue frio. Ela não teve reação e ficou presa na parede. Olhei aquilo e pensei: ‘o que é que eu vou fazer aqui?’ Vi a parede toda baleada, cheio de massa encefálica na parede. Eu peguei somente as marcas de tiros. Isso me marcou justamente por isso: não preciso escancarar um morto para mostrar a gravidade. Minha segunda foto importante foi do Lula, quando ele veio inaugurar a Vila Olímpica. Senti mesmo que estava na rua e tem de ter um momento certo, foi uma correria. Eu estava com fotógrafos do Brasil inteiro e acabei tendo fotos melhores que dos outros.

Primeira pauta de assassinato do fotojornalista João Paulo Santos. "não preciso escancarar um morto para mostrar a gravidade", diz

A primeira pauta a gente não esquece: “Não preciso escancarar um morto para mostrar a gravidade”, diz

Fotógrafo tem disso, de conferir o trabalho dos outros quando cobrem uma mesma pauta?

Fotógrafo é muito crítico. Às vezes você faz uma foto que o cara não fez, ou ele fez e você pensa que deveria ter feito. É questão de experiência, da próxima vez você corrige os errinhos, então sempre aperfeiçoa e tem novas ideias.

Quando teve a guerra no Rio, vários fotógrafos foram pra lá. Lembro de você ter comentado que queria ter feito isso também. Apesar de todos os riscos, o que essa adrenalina significa para o fotógrafo, de estar perto do fato e registrar historicamente essas situações?

Eu tenho um sonho de cobrir uma guerra. São detalhes que você marca a vida de milhões de pessoas. Igual esse fotógrafo do Rio Grande do Sul, que saiu na revista Fotografe Melhor, ele foi só com a roupa do corpo e o equipamento. Todo fotógrafo quer estar onde tem notícia. Se ver que o bicho está pegando no Rio de Janeiro, você quer ir. Quer ser o diferencial, mostrar o próprio trabalho, quer mostrar o que está acontecendo. O fotojornalista quer estar perto, se ele tiver de servir de escudo para a polícia, ele vai querer, porque ele quer essa foto.

Existe alguma situação em que você correu risco para ter a melhor foto?

Já. Entrei junto da polícia, invadimos a casa de um traficante. Não é o mais aconselhável, mas você está na adrenalina de fazer aquilo que ninguém tem. Você se expõe, não pensa.

Conheça mais o trabalho do fotojornalista João Paulo Santos no blog Em Fotojornalismo, clicando aqui.

Aquele velho medo conhecido

Foto: Ana Luiza Verzola

Eu passei muito tempo desejando ver o mundo diferente depois que eu fizesse 18 anos. Nada pareceu mudar, porque de fato, aqui dentro, nada realmente mudou à época. E logo se chega à casa dos 20, e paramos de contar as casas que vêm em sequência. Aí esperei durante quatro anos que a faculdade me fizesse ter confiança suficiente para encarar o mundo lá fora. Lembro-me de uma das aulas em que uma professora querida disse: “aqui dentro vocês estão protegidos pelo manto da faculdade, mas lá fora…” Ok, o manto da faculdade nunca me foi muito útil.

– Alô? Oi, boa tarde, meu nome é Ana Luiza, eu sou estudante de jornalis…

– Tu tu tu tu

O manto da faculdade nunca facilitou muito as coisas. A não ser pelo fato de criar – ah sim! Que preguiça que nada, o legal do tal do manto sagrado do ensino superior era apostar minhas fichas em um trabalho que eu acreditava sem precisar convencer os velhos de guerra que aquilo vingaria (investimento na empresa, anúncios, dinheiro, interesse…). Para mim vingou muito aprendizado, e para você?

Esses dias um primo – ah, esses familiares fanfarrões! – veio me questionar com ar de maldade se “os prêmios que você ganhou não fizeram diferença”. Ninguém sabe o que esperar do mundo lá fora. Respondi ironicamente que fizeram sim, para o meu ego.

Nós sabemos que não é bem assim.

Os prêmios não são bonitinhos só na estante do egocentrismo. Ninguém é bobo de acreditar que os prêmios vão te garantir emprego e roupa lavada. Não senhor. Mas por trás de cada história premiada (e não raro as não premiadas), meu bem, existe um fantástico bastidor para quem se aventurou na empreitada. E é assim, com esse carinho e com essa carga de conhecimento que eu lembro e guardo aqueles premiozinhos. Que me mostraram de fato o mundo lá fora – das poucas chances que provavelmente você que está encarando a academia agora, e esperando que quatro anos te transforme em um ser superior revolucionário e talentoso, não vai alcançar se não for atrás por você mesmo. Pelo puro gostinho de… Experimentar novos mundos.

Faz uma semana que de fato cheguei naquele Mundo Lá Fora. Venho encarando ele de frente, às vezes na espreita, tentando reconhecer algum traço familiar, em vão. Tenho medo desse tal admirável mundo novo, que de novo há pouco para se ver. Tenho mais medo ainda de entrar nos padrões e perceber que aquela euforia de correr atrás de situações que me rendessem bons aprendizados caiam por terra. Porque, bem, nessa terra de ninguém que dou passos macios, pé ante pé, eu não escolho mais meu caminho.

E agora, o que vai ser?

Toda vez que olho para esse mundo, não há como manter a linha e a pose. É puro desespero. Mas um desespero bom, de descoberta. O medo do senhor desconhecido.

E agora, o que vai ser?

Ninguém de fato se sente preparado para encarar os novos desafios. Não se sabe o que há de vir. O que vai diferenciar agora é o impulso de se arriscar. No que vier.

Mas… E agora?

“O sertanejo é um universo imenso”

Foto: Ana Luiza Verzola

A carreira dos músicos José Lima Sobrinho e Durval de Lima, conhecidos nacionalmente como Chitãozinho & Xororó, começa na década de 1970, no interior do Paraná, na cidade de Astorga (50 quilômetros distantes de Maringá), onde nasceram. Retornar às nostálgicas cidades interioranas, além de levantar a poeira da terra avermelhada levanta também a emoção de estar novamente em contato com a própria história.

Percorrendo um caminho árduo há mais de quatro décadas, a dupla mantém o pique e sustenta a carreira com o mesmo carisma e entusiasmo do início, quando, ainda meninos, começaram a se apresentar em circos para um público (quando existia) bem reduzido. Da origem simples para o acúmulo de 35 milhões de discos vendidos, lançamento de 34 álbuns inéditos, seis DVDs, dois Grammy e centenas de participações especiais em programas de rádio e TV, cabe ainda a saudade de tempos idos e da dedicação para participarem ativamente do desenvolvimento do sertanejo no cenário atual, influenciando vários artistas do ramo.

No final do ano passado a dupla realizou um show no Country Club de Maringá. Publico aqui a entrevista realizada por e-mail na ocasião:

Se a dupla Chitãozinho & Xororó surgisse no atual cenário de sertanejo no País, a trajetória de vocês seria mais fácil ou mais difícil de trilhar?

Chitãozinho: Todo início de carreira é bem difícil. O início da nossa carreira, há mais de 40 anos, já foi bem difícil, nos apresentávamos em circos, muitas vezes os investimentos dos shows saíam do nosso próprio bolso. Acredito que se estourássemos agora, começaríamos do mesmo jeito, nos apresentando em lugares menores. Mas acho que as dificuldades de um início de carreira sempre teríamos, há mais de 40 anos ou agora.

Depois de 40 anos de carreira, hoje o que continua motivando a dupla a tocar por todo o Brasil?

Xororó: O público sempre nos motiva. A alegria transmitida pelo público sempre nos impulsiona a cantar e, sempre, buscar o melhor de nós mesmos.

Recentemente gravaram a música “Do Tamanho do Nosso Amor”, com a dupla Fernando & Sorocaba. Sendo uma referência para as atuais duplas, acha que o sertanejo universitário foge das raízes?

Chitãozinho: Claro que não. O sertanejo é um universo imenso, e o sertanejo universitário é um movimento importante e está renovando, não só o público, mas os intérpretes da música sertaneja; acaba impulsionando o sertanejo como um todo, já que a geração mais nova acaba cantando as nossas músicas. As canções estão ganhando releituras e, assim, as novas gerações têm a oportunidade de conhecer os grandes sucessos de antigamente.

Suas história têm uma relação próxima com o Paraná, especialmente Astorga. Retornar ao interior e à terra vermelha traz alguma lembrança especial?

Chitãozinho: Com certeza! Astorga foi o nosso começo e é sempre bom poder voltar e encontrar um público tão caloroso como temos no Paraná. Nos sentimos sempre em casa.

A tradição sertaneja que marcou a estrada da dupla continua, mas sempre buscando inovações no meio fonográfico. Musicalmente falando, quais são os planos futuros?

Chitãozinho: Temos um novo projeto engatilhado, com lançamento previsto para o ano que vem. Nele estará incluída a música que fizemos em parceria com Fernando & Sorocaba, além de participações de outros artistas.

Nas primeiras modas que faziam no início da carreira, tinham as mesmas expectativas que o jovem atual nutre hoje em relação ao mercado?

Xororó: Acredito que sim, porque todos os músicos desejam ser reconhecidos pelo trabalho que fazem. Então, acho que todos que estão no meio querem suas músicas estourando e na boca do público.

Foto: Ana Luiza Verzola Foto: Ana Luiza Verzola
Foto: Ana Luiza Verzola Foto: Ana Luiza Verzola