Atocha, arrocha, afrouxa

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Foto: Roberto Furlan

“Ninguém quer a tocha!”, ouvi muita gente falar. É gente preparando balde, ameaçando usar extintor que “fomos obrigados a comprar e agora não é mais necessário”. Aí chega o Ricardinho, carregando o símbolo dos Jogos Olímpicos. Sorrisão de orelha a orelha. Ouço gritos. Correria para todos os lados para tirarem uma selfie. Muita gente conseguiu apenas uma foto com a “muvuca” de fãs e imprensa. Curiosos para todos os lados. Na plateia, crianças, adolescentes, adultos e idosos. Cãezinhos no colo. Os olhares todos direcionados para a Catedral, símbolo de Maringá, onde está a concentração. Algumas poses com o tal símbolo, os olhares acompanham cada movimento.

Na pista bloqueada para a passagem, caminhões de som atravessam acompanhados de fanfarra, pessoas dando tchauzinho por cima do veículo da Coca-Cola e de outros patrocinadores. Música animada dita o tom do momento. A tocha é acesa, começa o revezamento. Forma-se uma corrente de policiais para conduzir o atleta por um curto percurso até a estrutura montada para que ele atravessasse até a próxima pessoa. Vai passar, no final das contas, por 39 mãos de representantes de nossa cidade. A histeria é geral, muitos correm, tropeçam uns nos outros, querem acompanhar Ricardinho carregando a Tocha. O destino final é o estádio Willie Davids, ainda há algum trajeto a ser percorrido.

Converso com um jornalista, rimos dessa observação sobre a grande movimentação no entorno do evento, ele comenta: “Garanto que você queria estar agora na redação, sentadinha em frente ao seu computador, não é?”. Eu afirmo com a cabeça, mas também pensando quão legal foi estar ali, até para constatar a confusão no discurso e atitude de muita gente. Respondo uma frase que sempre afirmo: “O brasileiro deveria ser estudado”. Ah mas que diabos as “OlimPIADAS”, como dizem, no Brasil, com tanto desastre acontecendo, não é? É, não tiro a razão de ninguém. Mas discurso de ódio nesse momento vai servir para quê mesmo? Protesto nessa hora é não prestigiar, claro. Ameaçar fazer “n” coisas com a tal da tocha. Atocha, atocha, atocha. Poderia ser um arrocha, já que está em solo brasileiro.

Eis que me vejo diante da realidade descrita ainda como utopia pelo colega jornalista. Estou sentada diante do computador e refletindo sobre tudo isso. O atraso da tocha, e mesmo assim centenas de pessoas posicionadas ali para ver a bichinha passar. Atraso de algumas horas, viu? A bonita ia chegar em Maringá às 9 horas, chegou passava das 10. Abro meu Facebook, aquela rede social em que até pouco tempo atrás presenciava uma guerra entre pessoas contra e a favor da tocha. Minha timeline se resume agora a selfies com o Símbolo Olímpico, vídeos do revezamento, pouco vejo sobre água e o escambau para ser arremessado contra a tocha. Como se os atletas, que tanto batalham, muitas vezes sem patrocínio, para carregar no peito a bandeira de nosso País, não merecessem atenção, respeito e apoio nesse momento único.

A raiva do brasileiro é acumulada por várias situações, e a tocha veio para incendiar toda essa gasolina que estava arremessada no histórico do País dos últimos tempos. Gasolina sim, que tá caro. E o preço que o brasileiro paga é caro. Paga caro pelo discurso raso, por não arcar com as consequências do que afirma que vai fazer – e não faz. A histeria continua, afinal, a Tocha Olímpica está passando por Maringá. Ouvi gente falando de orgulho por presenciar esse momento, aglomerações em prédios para também observar. Ué? O brasileiro precisa realmente ser estudado.

No final das contas, sentadinha aqui diante do computador, comendo meu horário de almoço para escrever essas linhas, passo a mão pelo meu cabelo. Que mané jogar coisa na tocha. Quem levou no final fui eu, uma bela de uma cagada de passarinho na cabeça. Minha avó diria que é sinal de sorte. Que seja!